Como já ontem disse, fiz parte da 1ª.Comissão de Recenseamento da Amadora, primeiro aqui na minha Freguesia, que então no passava de uma povoação e depois na sede da Freguesia, hoje Concelho da Amadora.
Muitas foram as peripécias que nos aconteceram.
Lembro-me especialmente de duas, durante o Recenseamento. Uma senhora, acamada há muitos anos e com os dedos já deformados, que nos pediu para irmos a casa recenseá-la. Quando o fomos fazer chorou agarrada a nós.
-Agora já posso morrer porque já posso ser enterrada.
Perante o nosso espanto contou-nos que alguém lhe dissera que, se morresse e não
estivesse recenseada , não podia ser enterrada.
Outra, uma senhora que tinha nascido no Brasil e que embora filha de Portugueses e casada com um português,mantinha a nacionalidade brasileira.
O que ela lutou para ter a nacionalidade Portuguesa!
Conseguiu-o à ultima da hora e foi a penúltima a inscrever-se.
O último foi um Senhor que durante todo o tempo que durou o recenseamento, nos apoiou, andando de porta em porta a recolher os elementos que, por vezes, deixávamos escapar. Grande Amigo que já partiu.
No dia 25 de Abril de 1975, às 7 horas da manhã, já não se rompia no Largo 1º de Maio, tantas eram as pessoas que tentavam ser as primeiras a votar.
Coube-me abrir as portas do complexo Escolar e quase fui levada pelo ar quando o fiz.
Também desse dia guardo boas e más recordações.
A de uma senhora que a meio da tarde nos apareceu a chorar porque queria retirar o voto dela da urna.Tinham-lhe dito que se ganhasse o partido em que tinha votado lhe tiravam a Pensão, seu único meio de subsistência. Foi dificilimo fazer-lhe compreender que ninguém sabia qual era o voto dela e que nenhum partido poderia fazer isso. Passados anos ria-se connosco ao lembrar-se.
Outro caso, o de um marido que queria ir com a mulher para a urna porque a mulher ia votar num determinado partido e ele não queria que ela o fizesse.
Nas costas dele a mulher fazia-nos sinais desesperados para não o deixarmos.
Esse caso requereu a presença da Autoridade, o Tenente dos Comandos que nos faziam segurança e que não só se manteve junto do marido enquanto a Senhora votou, como perante as ameaças que ele lhe fez o avisou de que se houvesse qualquer tipo de violência sobre a esposa ele seria preso.
Depois, o partido em que votei teve apenas 2 votos, o meu, claro e o de um elemento doutra mesa!
Passaram-se 34 anos, já se pode falar destas coisas!
Felizmente as pessoas hoje estão mais esclarecidas, já ninguém tem medo de votar seja em que partido for.
Pena é que, no meio de tantos Partidos, no meio de tantas discussões, no meio de tanto lavar de roupa, continuamos todos a precisar que nos esclareçam sobre o que precisa e não é ,de ser esclarecido.
Confusos? Eu também!