ONTEM FIZ
Aquilo que não quero e não volto a fazer. Mas ontem tinha que o fazer.
No meu primeiro dia, ou primeira tarde, de reformada fui para o jardim.
A tarde estava agradável e soalheira e, embora o jardim tenha árvores já cinquentonas, o sol conseguia filtrar-se por entre os ramos.
Provavelmente como consequência do recente temporal de granizo.
A verdade é que momentos antes tinha encontrado uma tia do meu ex-marido, tal como eu recentemente reformada e sentámo-nos a conversar.A conversa foi o pretexto porque o que eu queria mesmo era ver o que se passava à minha volta.
E vi, homens e mulheres envelhecidos, curvados, alguns de bengala, que conversavam das doenças, dos problemas, das magras pensões e até, imaginem do modo como são tratados.
Alguns jogavam às cartas em duas ou três mesas e mais nada.
Recordo-me daquelas pessoas há apenas alguns anos. Conheço muitos deles desde sempre (moro aqui há 47 anos) e fez-me muito má impressão ver como envelheceram em tão pouco tempo. Vi-os a viver a vida de quem não tem nada para fazer, de quem se entretém apenas a matar o tempo e alguns até não são assim tão idosos.
Em tudo isto apenas duas coisas me alegraram. Como o jardim está no Largo da entrada da povoação e é um local de passagem, encontrei ou fui encontrada, por conhecidos e amigos que não via há muito.
A outra foi um senhor idoso, bastante idoso, que se encontrava sentado no mesmo banco e a quem a certa altura uma jovem (bisneta ao que percebi), foi buscar e levou, carinhosamente, de braço dado, enquanto conversavam. Gostei da forma suave como a jovem o conduzia. Via-se amor entre eles e também esse sentimento não é muito habitual da parte de alguns jovens para familiares idosos.
Estava lá há cerca de meia hora quando senti necessidade de ir-me embora.
Parecia-me que, se ficasse ali mais tempo sentada, acabaria agarrada ao banco e ao jardim. E ficaria exactamente como não quero.
A sentir-me não como reformada a descansar de horários e compromissos laborais, com VIDA para viver, coisas para fazer e até para aprender mas como uma mulher velha, curvada, a falar de doenças e de coisas más.
E não é esta vida que quero para mim.
Estou reformada mas estou Viva e é assim que quero continuar.